E então, quando a vida mais pesou, ele percebeu que a única maneira de contrabalançar aquele peso era usando o seu exato contrário. E qual é o contrário do peso, senão a leveza?
Percebeu que a perna da sua alma estava presa a uma corrente e no fim dela uma enorme bola de ferro que trazia um monte de coisas pesadas. A âncora do Titanic perdia!
Eram assuntos mal digeridos, mágoas que ainda vicejavam, rancores não esquecidos, coisas não perdoadas... Tudo isso o arrastava para baixo e o impedia de dar os passos rumo à Meta.
Não conseguiria caminhar na direção do seu Objetivo com aquela coisa segurando seu espírito. E tentou serrar a corrente. Com a lima da Força. Nada. Nem arranhou o aço daqueles elos. Buscou o machado do orgulho próprio. Também não funcionou. E nem a motosserra da vaidade conseguiu romper aquela corrente tão dura e forte. Começou a desanimar.
E lembrou que Força contra Força pode não ser o caminho. E usou de suavidade. De leveza. E sorriu para o que lhe fazia carranca. Semblante tranquilo para o que lhe mostrava cara feia. E de repente se sentiu bem. E chorou lágrimas de contentamento. Sentiu-se leve, como se já estivesse livre dos fardos. Sem que soubesse, na verdade já estava.
E suas lágrimas de alegria - que ele ainda não entendia - caíram sobre a corrente. E o efeito foi de surpreender. Como um tipo de ácido, o pranto feliz derreteu primeiro os elos onde caíra. E depois os elos imediatamente vizinhos da esquerda e da direita. E depois os seguintes, e os outros depois... e logo não havia mais corrente, nem tornozeleira... e a bola ficou ali, parada, patética, inútil sem estar atrelada a nada.
E ele caminhou, seus primeiros passos leves. E endireitou a coluna e andou ereto, e todos que batiam o olho nele viam de repente que ele mudara. Estava radiante, não era mais um arremedo do corcunda de Notre-Dame, mas alguém que se movia com harmonia de gestos. E sua nova luz - onde antes havia só trevas - contagiou a todos.
E logo ele era capaz de levitar e de voar. Mas gostava de ter os pés no chão, para não perder o contato com a realidade. Que é a única coisa palpável que se tem. Mas ela não cerceia sonhos. É possível sonhar o sonho possível. E ele sonhou.
E sorriu de si para si, pela primeira vez, ele que jamais sorrira para si mesmo antes. O sorriso mudou sua fisionomia. E não era um riso de bobo-alegre, sem motivos. Sorria porque sabia, de alguma maneira sabia, que uma nova era se iniciava.
E que estava começando efetivamente a viver, ele que até então apenas existira.
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